O fórum bilingue como antecipação do e-tandem

Jean-Pierre Chavagne
Universidade Lumière Lyon 2

Artigo publicado em Intercompreensão, n°13. Dezembro2006. Edições Cosmos/Escola Superior de Educação de Santarém, p. 163-181, ISSN 0872-3893

Résumé

Les forums bilingues, dans lesquels chaque élève ou étudiant écrit dans sa langue, deux classes de langues différentes étant ainsi en contact, permettent une communication authentique dès le début de l’apprentissage d’une langue. Une telle activité d’intercompréhension constitue aussi une préparation à l’e-tandem, autre activité de communication électronique pour l’apprentissage mutuel des langues. Pendant trois ans, les forums bilingues et les e-tandems ont été proposés à des étudiants de portugais en France et à des étudiants de français au Portugal et au Brésil, de façon facultative, dans un ensemble d’activités de travail autonome. Des échanges ont également eu lieu en espagnol e en français de la même manière. L’expérience m’a donné l’occasion de faire des observations sur les comportements des étudiants, observations qui ont permis de déterminer une espace virtuel approprié, aussi bien qu’un encadrement pédagogique adéquat. Les conditions techniques, institutionnelles, et psychologiques seront analysées dans la perspective d’une banalisation de ces activités, capables de transmettre des valeurs humanistes. Mots clés : forum bilingue, intercompréhension, e-tandem, e-twinning

Resumo

Os fóruns bilingues, em que cada aluno escreve na língua dele, duas turmas de línguas diferentes estando assim em contato, permitem uma comunicação autêntica desde o início da aprendizagem de uma língua. Tal atividade de intercompreensão constitui também uma preparação ao e-tandem, outra atividade de comunicação eletrônica para aprendizagem mútua das línguas. Durante três anos, os fóruns bilingues e os e-tandens foram propostos a alunos de português na França e a alunos de francês em Portugal e no Brasil, de forma facultativa, num conjunto de atividades de trabalho autônomo. Fizeram-se também trocas em espanhol e francês da mesma maneira. A experiência deu-nos a oportunidade de fazer observações sobre os comportamentos dos alunos, observações que permitiram determinar um espaço virtual apropriado, bem como um enquadramento pedagógico adequado. Serão analisadas as condições técnicas, institucionais, e psicológicas na perspectiva de uma banalização destas atividades, capazes de transmitir valores humanistas. Palavras-chave: fórum bilingue, intercomprensão, e-tandem, e-twinning

Introdução

O tandem face a face e sua versão eletrônica, o e-tandem, são bem mais conhecidos e estudados hoje em dia no mundo da didática e da pedagogia das línguas. Mas eles são pouco praticados no seio da instituição escolar e universitária apesar de uma evolução das concepções de aprendizagem e de um novo contexto planetário. O fórum bilíngue, que coloca em jogo o princípio da intercompreensão, é, ele sim, mais novo, apesar de a intercompreensão ser objeto de mais de vinte anos de pesquisas voltadas para a aprendizagem das línguas. Se existe sobre o tandem uma bibliografia abundante em diversas línguas, e particularmente em alemão1), não existe praticamente nada sobre o fórum bilingue mesmo se, sobre a questão da intercompreensão em geral, a bibliografia já é rica2). Mas se existem experiências, mesmo muito minoritárias, é porque, sem dúvida e principalmente, trata-se, para os grandes públicos confiados às instituições, de aprender línguas hoje em dia dentro de um contexto, europeu e mundial, que não tem mais muita coisa a ver com o contexto que conheceram os professores que hoje se encontram em final de carreira, quando eles próprios eram alunos ou estudantes. Naquela ocasião, não se falava em internet e não se imaginava sua existência. Os contatos longínquos com os locutores da língua que se estava aprendendo se faziam pelo correio postal e, segundo eu saiba, sem nenhum enquadramento pedagógico. Também não se tinha consciência do que poderia ser uma Europa de 20 línguas manifestando o desejo de se compreender e de intercambiar em todos os níveis. A mundialização ainda não estava na ordem do dia, nem o desejo de abolir fronteiras. Na época, a verdadeira comunicação entre as grandes zonas linguísticas do mundo era assunto de raros especialistas, os tradutores, os jornalistas, alguns professores de universidades, e a grande maioria das pessoas que aprendiam línguas podiam muito bem jamais utilizá-las, o que fazia encontrar outras virtudes para seu aprendizado: a formação do espírito, um melhor conhecimento de sua própria língua, a cultura. Deste tempo, subsistem algumas representações não adaptadas ao contexto do século XXI, dentro da tradição pedagógica e dentro das expectativas dos próprios alunos e estudantes. Ora, as viagens e outras estadas longínquas tornam-se comuns e, sobretudo, têm-se acesso, com alguns clics, a modelos linguísticos numerosos e variados, sob forma de textos, de sons e de imagens que, cada vez mais, nos permitem comunicar com certos modelos como faríamos se estivéssemos “dentro daquele país”, sem contar os canais de televisão do mundo inteiro que chegam dentro dos nossos lares. À pergunta “Qual é a melhor maneira de aprender línguas?”, que eu faço regularmente aos meus novos alunos, a resposta mais frequente é desta ordem: viver em um país onde ela é falada. Eles não parecem, portanto, estar francamente convencidos de que as condições nas quais eles aprendem línguas sejam as ideais. O fato é que não é necessário fazer longas enquetes3) para constatar que nossos alunos e estudantes não aprendem maioritariamente as línguas dentro dos cursos. O que se faz aí é uma preparação muito boa para a aquisição das línguas e permitirá, sem dúvida, a muitos deles aprendê-las mais rapidamente quando uma motivação forte se apresentar; no entanto somos obrigados a admitir que eles não atingirão, a não ser minoritariamente, as competências suficientes para uma boa comunicação em situação autêntica na língua que estão aprendendo, como por exemplo durante uma viagem ao país dessa língua. O que pode ser eficaz em contexto autêntico pode ser trazido para os dispositivos de aprendizagem que nós propomos aos alunos 4)? Partindo da hipótese que o diálogo com o locutor da língua estudada exerce um papel preponderante num ambiente de aprendizagem, eu, desde que possível e com os meios do ambiente, experimentei colocar os estudantes em relação direta, inicialmente pelo tandem, depois pelos fóruns bilingues. É, portanto, sobre minha prática de professor de português no ensino superior francês 5) que vou me apoiar neste artigo para apresentar atividades de diálogo autêntico à distância entre alunos de línguas diferentes, em intercompreensão nos fóruns bilingues e pelo tandem. Depois de 7 anos, essas experiências agora abundam e me permitem fazer uma série de observações referentes aos comportamentos dos estudantes, mas também sobre o conjunto das condições humanas e institucionais onde se encontram ao mesmo tempo resistência e aceitação. Darei, inicialmente, alguns elementos sobre o meio no qual estas experiências se desenrolaram, antes de precisar em que consiste a atividade tandem e como ela encontrou seu lugar. Em seguida, apresentarei a lógica na qual o fórum bilingue, do qual me será necessário mostrar os princípios, foi adotado. De passagem, as questões levantadas por estas práticas serão examinadas dentro de uma ótica que eu ouso chamar sistémica, no sentido de que há uma finalidade para esta reflexão, que ela considera a complexidade do sistema educativo, a complexidade da aprendizagem de uma língua e da própria sociedade, e que ela só para diante dos fatos como reveladores das interações no seio destes sistemas, aliás independentes. Persuadido que é agora que devemos nos perguntar sobre uma generalização deste tipo de projeto, sem o qual os alunos aprenderão as línguas sem nós, o que sempre foi possível, mas agora cada vez mais para grande número deles, no tempo da Web social 6) e da mobilidade, eu defenderei em seguida esta generalização.

1. O ambiente da aprendizagem

Em 1999, eu descobri a existência do e-tandem, que uma colega professora de alemão havia praticado no estabelecimento onde eu acabava de entrar 7). Decidi fazer esta experiência, numa sequência lógica da correspondência escolar que eu havia praticado como professor em outros níveis da educação, primária e secundária, de onde eu vinha. Não tive dificuldade para encontrar um colega interessado na Universidade de Aveiro em Portugal e, no ano seguinte, uma colega brasileira da Universidade de São Paulo (USP)8). Mas só em 2003 eu propus a nova atividade precedente, o e-tandem, à qual dei o nome perturbador e intimidador de fórum bilingue 9). Estas duas atividades de aprendizagem do lado do português estavam a partir daquele momento integradas a um ambiente de aprendizagem, ao lado de ateliês de expressão oral, de trabalho autônomo nas salas de recursos, de trabalho autônomo à distância sobre uma plataforma de cursos, e de conversações presenciais com estudantes lusófonos. O tempo consagrado a esta aprendizagem por semestre é o equivalente daquele consagrado oficialmente às 21 horas de aula, e os objetivos a atingir em um semestre com tal horário são portanto forçosamente limitados, mas o tempo consagrado a cada atividade é igualmente muito limitado. Por esta e outras razões que eu evocarei mais tarde, eu dei um caráter facultativo às atividades de comunicação autêntica: e-tandem, fórum bilingue e conversação presencial. Portanto, o estudante faz escolhas responsáveis dentro deste ambiente complexo, conversa com o professor na metade do semestre durante uma entrevista, e se apresenta para uma avaliação das quatro competências no final do semestre, avaliação que hoje é sanciosanda por uma nota, solicitada pela universidade, mas que poderia sem isso se limitar a uma validação ou a uma não-validação. Eis no quadro abaixo o esquema atual de ambiente de aprendizagem do português proposto aos estudantes, onde o fórum bilingue e o e-tandem se colocam dentro da comunicação autêntica.

Comunicação autêntica
-Fóruns bilingues
-E-tandem
-Conversações com estudantes lusófonos
-Tandem face à face

Outro trabalho autônomo
-Salas de trabalho autônomo:

  • Documentação
  • Computadores conectados

-Plataforma de curso (à distância)
-Bibliotecas:

  • Instituto de Estudos Brasileiros
  • Centro de língua portuguesa do Instituto Camões

Enquadramento pedagógico
-Ateliês de expressão oral (ou aula) com professor
-Diálogo com o professor à distância
-Entrevistas individuais

Mesmo persuadidos de que a situação autêntica é a mais eficaz, os estudantes estão bem longe de se lançar sobre as atividades que mais se aproximam desta autenticidade. Mesmo após terem dito que a melhor maneira de aprender uma língua era de se encontrar dentro do país onde é falada, eles exprimem de forma recorrente o desejo de cursos clássicos, de “bases”, e de gramática, principalmente no primeiro semestre de aprendizagem. Para a quase totalidade deles, é sua primeira experiência de um aprendizado no qual uma parte tão importante de auto-formação, já que o volume de trabalho autônomo solicitado é quase duas vezes maior que o do presencial. Alguns experimentam mesmo um sentimento de desconforto, achando que é o professor que deve fazer as escolhas em seu lugar. Este sentimento de confusão só encontra uma solução com os primeiros progressos, e é por isso que lhes é solicitado, para melhor viver esta complexidade, de manter um diário de aprendizagem que permite de modo pessoal tornar concretas e familiares as dificuldades inerentes a todo aprendizado. O Centro de Línguas, que existe desde 1991, escolheu conciliar e conduzir de frente o aprendizado da língua e da autonomia, com uma convicção relativamente compartilhada por professores de diferentes línguas (5 no início, 15 hoje em dia), mas também com um quinhão de interrogações que não cessam de desafiar esta opção, bem como a variedade das adaptações pessoais desta idéia pelos professores.

1.1 O tandem

É pelo tandem, portanto, que esta experiência começou, e é sem dúvida útil precisar o que é o tandem10). Não farei uma apresentação detalhada desta atividade sobre a qual existem numerosas obras11) e me limitarei a algumas palavras sobre o e-tandem12). No e-tandem, dois alunos ou estudantes são colocados em comunicação por e-mail como parceiros para um complemento de aprendizagem mútua da língua do outro. Portanto, a base da atividade é a escrita de e-mails e um correspondente, empregando sua própria língua para dá-la a ler e a língua do outro para ajudá-lo a progredir, como expert que é em sua própria língua, mas sem traduzir. Supõe-se que cada um aprenda a língua do outro dentro de um contexto institucional onde esta atividade se encontra inclusa. Ela é então enquadrada e avaliada por um professor, cada professor trabalha portanto com um parceiro do país da língua que ele ensina. No tandem, comunicamo-nos com o outro para aprender com ele e ajudá-lo a aprender. O e-tandem permite três níveis de projetos: um projeto pessoal de cada parceiro, um projeto comum particular entre dois parceiros, e um projeto comum entre os dois grupos. Para a prática do e-tandem, é preciso que os dois professores do projeto formem eles próprios os pares de parceiros, alunos ou estudantes. Como raramente os grupos são iguais em número, alguns devem aceitar dois parceiros. E para perturbar mais um pouco o que poderia ser uma bela relação bijectiva, algumas parcerias criadas desta maneira não funcionam, principalmente em nível de ensino superior onde os estudantes partem durante o ano, outros não recebem respostas de seus correspondentes, sem contar os problemas técnicos, todas essas razões que não permitem fazer razoavelmente disto, a atividade central da aprendizagem, do momento em que uma parte do grupo não consegue se dedicar às atividades previstas. Num horário restrito, em razão dos impasses nos quais se encontram os estudantes quando os tandens não estão funcionando 13), um caráter deliberadamente facultativo é dado à atividade e ela é então proposta ao estudante entre outras atividades de trabalho autônomo. A primeira observação é que os estudantes geralmente não compreendem do que se trata até que comecem a prática do tandem. E se aqueles que tentam mostram-se às vezes entusiastas e experimentam um “déclic” na sua aprendizagem, restam os estudantes que jamais entenderão a proposta. Minha hipótese é que esta atividade está em grande defasagem com a representação que o estudante tem da aprendizagem de uma língua, principalmente num quadro universitário. Esta relação autêntica entre alunos está na tradição da correspondência escolar 14), pois se trata de mais que uma simples correspondência, de uma situação que está próxima da correspondência escolar de Célestin Freinet.

1.2 O fórum bilingue

Insatisfeito dos pares de estudantes arbitrariamente formados para a prática do tandem, eu tentei em 2004 uma maneira mais natural de fazê-los se encontrar, um sítio de fórum bilingue 15), aberto aliás a outros pares de línguas além do francês e do português, sítio que está hoje na sua terceira versão sob o nome de Lingalog 16). A escolha do parceiro, de certa forma, não é mais responsabilidade do professor porque o estudante o escolhe em função das suas intervenções no fórum. Paralelamente, eu estava participando da concepção da plataforma Galanet e as questões do plurilinguismo me fizeram ver como evidente esta antecipação pelo e-tandem. Eu tinha também acabado de assistir naquela época a uma representação do sítio do projeto Cultura 17), por sua criadora Gilberte Furstenberg, sítio onde o fórum bilíngue francês-inglês é utilizado desde 1997, o que acabou por me convencer. A idéia era, portanto, que antes de começar o tandem, os estudantes de dois grupos trocariam idéias nos fóruns e tomariam a iniciativa de propor formar um tandem a um estudante do outro grupo, a atividade tandem encontrando-se assim facilitada por uma caixa de correio integrado ao mesmo sítio dos fóruns bilingues. O princípio a ser respeitado num fórum bilingue é que cada um oferece intervenções na sua língua, para que os leitores da outra língua possam melhorar suas competências de compreensão escrita. Esta regra revelou-se muito difícil de ser respeitada, o que eu atribuo uma vez mais à marca das tradições. Exprimir-se na língua do outro continua no entanto difícil até um estágio avançado da aprendizagem. A partir do momento em que todas as mensagens na língua do outro estão dentro de uma língua intermediária, para não dizer “trufadas” de erros, fazê-lo publicamente em um fórum traz também vários problemas: a dificuldade de se fazer compreender, a correção pelo professor, o respeito pela idéia inicial. Enquanto que escrever em sua língua não apenas evacua estes quebra-cabeças pedagógicos, mas ainda cria uma situação de intercâmbio onde o conteúdo passa e onde a forma é respeitada. Obviamente, apenas uma competência linguística é procurada no fórum bilingue, mas a prática do tandem que se seguirá permitirá a expressão escrita e sua melhoria graças à ajuda do parceiro. O fórum terá portanto, assim, a vantagem de diferir a comunicação privada, linguisticamente mais difícil, e de preparar o estudante para isso.

2. Outros projetos e outras escolhas pedagógicas

Esta escolha de expressão na sua própria língua para as partes públicas do intercâmbio, por oposição à atividade privada que constitui o tandem, não é unânime. Assim o projeto Viva 18), por exemplo, recomenda o fórum unilinigue e não obedece à mesma lógica: “Não nos esqueçamos o respeito da língua escolhida pelo interlocutor. Se respondemos a uma mensagem começada em espanhol (ou em francês, ou qualquer outra língua), devemos responder na mesma língua. Se não desejamos responder nesta língua, é melhor começar uma nova mensagem dando-lhe um título similar, antes que de responder numa língua diferente da escolhida.” 19) Essas divergências de escolhas pedagógicas não são para surpreender e tem mesmo muita chance de sobreviver ainda por longo tempo também dentro das novas práticas. Mas elas reportam sobretudo sobre o fórum bilingue. Um projeto de intercâmbio entre turmas desenvolvido em um Lycée de Grenoble, por Jean-François Cerles 20), coincide, para a parte do tandem, com as práticas correntes: “O e-mail deve ser uma atividade 21) livre e completa durante os períodos de liberdade, na escola ou em casa, (salvo no retorno das férias, onde é imperativo e necessário que todo mundo escreva ao mesmo tempo).” “Cada carta deve ser escrita inicialmente na língua estrangeira, depois na língua nativa, sem mistura, para permitir que a compreensão e a expressão sejam exercidas dos dois lados.” O enquadramento é, no entanto, mais estreiro do que se pode fazer no ensino superior, retirando-se um pouco da confidencialidade da correspondência privada: “Cada aluno, francês ou americano, deve enviar uma cópia de sua carta aos dois professores a fim de que eles possam acompanhar de perto a atividade. Toda carta não enviada com cópia não é contabilizada para a nota de correio. As cartas são anotadas pela quantidade (mínimo obrigatório determinado e indicado no início do semestre, normalmente uma por semana) e pelo interesse do conteúdo - e não da gramática. O objetivo é encorajar a assumir riscos (sair das pequenas frases no presente que todo mundo conhece e tentar se exprimir corretamente) e a desenvolver as competências da escrita num nível mais avançado, induzido pela comunicação autêntica com jovens anglófonos.” “As cartas são lidas pelos professores, mas não censuradas nem corrigidas. No entanto, é necessário chamar atenção para os erros correntes (do tipo “Excuse me for my late…”) para corrigi-los em classe, com todos juntos. Também é preciso controlar o conteúdo para evitar os malentendidos constrangedores (duas ocorrências em 4 anos sobre centenas de mensagens).” O projeto de Jean-François Cerles é a base de todo seu ensino e comporta outros aspectos, inclusive viagens, mas paremos sobre o chat, que para ele é alternativamente unilingue. “As sessões de chat são sem dúvida (com exceção das viagens) a atividade que mais motiva os alunos. As sessões duram 50 minutos, dos quais 25 em francês e 25 em inglês, sem mistura.” Por seu caráter rápido e efêmero (ainda que se possa conservar uma cópia), o chat se aparenta à conversação e permite correções recíprocas instantâneas, tanto quanto interações constantes sobre o conteúdo e a forma. Neste sentido, é perfeitamente concebível pedagogicamente que os chats sejam unilingues. O projeto Cultura no entanto não incluiu o chat, e o projeto Lingalog também não, por enquanto. A razão também é pedagógica: a atração excessiva do chat que bloquearia o fórum, e também a dificuldade de controlar sua organização à distância por causa do seu caráter sincrônico, o que não se produz com o fórum e o tandem, todos os dois assincrônicos. Mas o chat pode ser utilizado como o centro de um projeto como é o caso do Teletandem Brasil 22) que coloca os estudantes em contato sobre um mensageiro instantâneo por conversação áudio.

3. Paradoxos em série

Citar projetos diversos e que terminam por serem numerosos poderia dar a impressão que a comunicação à distãncia entre pares é uma prática corrente na aprendizagem das línguas, mas não se pode confundir número e porcentagem. É com efeito outro paradoxo constatar que à nossa volta essas práticas são raras e mesmo quase inexistentes e pode-se perguntar se elas se desenvolverâo significativamente um dia. A dificuldade, a incapacidade de encontrar parceiros é frequentemente evocada, mas aí também, o número de organismos que se propõem a colocar em contato professores além das fronteiras, existem e funcionam. Em nível europeu, uma iniciativa que desempenha este papel é o e-Twinning 23). Existem outros organismos 24), e tem-se a impressão de uma certa facilidade em enconttar parcerias, apesar de que a falta de parceiro seja de fato o argumento mais levantado pelos professores que gostriam de se lançar nesta atividade e não conseguem. A vontade política contrariada pelo sistema ainda é um paradoxo. Os projetos desta natureza tem um certo prestígio e são geralmente bem considerados nos estabelecimentos onde eles são realizados. Não é falso dizer que sair da sala de aula graças às tecnologias é encorajado por uma vontade política: “Aliás, uma plataforma de cybercorrespondência será posta em prática em 2001 para permitir a cada aluno, em seu percurso escolar, estabelecer intercâmbios em duas línguas estrangeiras.” 25)

3.1 A timidez

A estes paradoxos acrescenta-se o contraste entre a idéia dos estudantes de que se aprende bem uma língua com aqueles que a falam e sua demanda recorrente de cursos clássicos. Mas é ainda entre os estudantes que encontramos os elementos mais positivos a favor do desenvolvimento dessas atividades, ao lado, é verdade, de comportamentos desfavoráveis. É assim que existe um certo entusiasmo à idéia de comunicar-se com alguém distante e diferente, e que os estudantes que o praticaram dizem que o trabalho em tandem é um prazer, e reconhecem os efeitos disto no seu aprendizado. Mas, mais da metade dentre eles, aqueles que conseguiram voluntariamente entrar neste tipo de relação, parecem freados por aquilo que poderíamos chamar de timidez. Se certos professores exprimem constrangimento face a situações como essa, os próprios estudantes se revelam tímidos em proporções significativas. Eu chamo “timidez” o sentimento que parece mais complexo que a falta de audácia e que o aluno experimenta antes de se lançar em uma comunicação com pessoas verdadeiras que não são de sua esfera familiar e social. Não se trata, portanto, de timidez no sentido exato desta palavra, mas vale a pena interrogar-se sobre o comportamente de alguém que aprende uma língua e que parece preferir não utilizá-la em condições reais quando lhe é oferecida a possibilidade, ce qui reviendrait, somme toute, a aprender a nadar fora da água até o momento de entrar nela, mesmo se não é bem a mesma coisa, ou que recai sobre aquela pedagogia da música que obriga a solfejar sem tocar o violino durante um ou dos anos. A implicação com a qual hoje em dia esses mesmos jovens interagem com as máquinas contrasta com esta “timidez” (videogames, televisão, jogos portáteis); um outro contraste é o frenesi com que se procura falar com familiares e amigos por telefones celulares muitas vezes sem ter nada de concreto a dizer. Esta “timidez” com locutores de uma língua que se aprende, que se manifesta por um bloqueio (sobre 356 inscritos, 243 se contentaram em ler e não postaram nenhuma intervenção nas discussões, depois de 8 meses de funcionamento não direcionado 26)), é mais visível ainda já que ela é proposta em um enquadramento oficial por um representante da instituição universitária, e podendo ser reconhecida no momento da avaliação. Todos os alunos não precisam do mesmo tempo nem das mesmas condições para chegar ao mesmo resultado. Cada um tem sua experiência, sua motivação, seu ritmo, seus meios. Os fóruns bilingues e o e-tandem respeitam o aluno ao ponto que ele pode mesmo não fazer nada caso ele sinta uma resistência/reticência muito grande para assumir o que chamamos risco. A timidez é respeitável e mesmo suficientemente delicada para forçar alguém a superá-la pela força da autoridade. Ao lado desses comportamento passivos ou oportunistas, há estudantes que vão consegrar bastante tempo e muita energia a estas atividades.

3.2 Um sistema autolimitador

Se jogarmos um olhar sobre a instituição, sem cessar de considerar que ela faz parte de uma sociedade mais larga e mais complexa, pode-se ver nela três subsistemas imbricados que entram em jogo: -o da instituição propriamente dita, globalmente, com sua contabilidade, seus horários, seus programas, seus funcionários, professores ou não, seus regulamentos, suas leis, etc e é-nos difícil dizer qual elemento oferece maior resistência 27); -o do material: os computadores (na escola e em casa, ou em qualquer outro lugar), as redes e sua capacidade de rendimento, as salas de trabalho, e sabe-se que há frequentemente problemas técnicos e necessidades de formação para sua utilização; -o da plataforma utilizada: programas, ferramentas, desenvolvimento possível para uma melhor adaptação pedagógica, que necessita recorrer às competências em informática, e a créditos. Vários aspectos dessas atividades, que poderíamos chamar “atividades de comunicação autêntica à distância entre pessoas em aprendizagem de uma língua”, sem nos limitar ao fórum bilingue e ao e-tandem, perturbam de alguma maneira o equilíbrio de um sistema. Um dos problemas, levantado por Patricia Kohler-Bally, se produz nas nossas práticas de avaliação: “A última reserva que nós lançaremos toca a avaliação interna pela instituição: como controlar um certo número de novas competências adquiridas nesta experiência, por exemplo, competências de ordem técnica ou de natureza sociocultural, necessárias para a comunicação informal por correio eletrônico?28) Esta dificuldade expressa uma defasagem pedagógica pelo lado menos facilmente apreensível das competências extralinguisticas, tradicionalmente não avaliadas, e ilustra o problema que se põe para dar lugar a estas atividades num espaço já preenchido. Os parceiros potenciais hesitam por longo tempo, eles não recusam abertamente, mas nem sempre sabem qual status dar a essas atividades e como eles poderiam fazê-las sem abandonar as outras que já ocupam todo seu tempo. Acrescentemos a isto, que hoje em dia o professor ainda deve criar suas ferramentas praticamente sozinho, mas pode-se imaginar , em um futuro próximo, que existirão outras plataformas adaptadas, mais fácei para instalar e utilizar. Outro aspecto bloqueador: o choque com a concepção linear da aprendizagem que os alunos exprimem pela sua demanda de “bases” e que os manuais reforçam. Trata-se mais de apreender do que de aprender uma língua partindo do simples em direção ao complexo. Ora, uma outra conceção é que a língua se encontra inteiramente num enunciado curto, embrionária, e que a aprendizagem linear, e a sua fé na gramática, permite menos a apreensão dos modelos fractais que favorecem a aquisição da língua. O fato de o estudante trazer o conteúdo e a forma e se confrontar com o que trazem seus pares é também uma verdadeira inversão em relação ao papel do docente considerado modelo único, mesmo se este modelo se encontra em processo de desprestígio. Há, também, evidentemente, o medo natural de se arriscar, a desestabilização que representa uma mudança da relação entre o professor e os alunos, nomeadamente este passo a mais na direção do abandono do estatuto de modelo e para o abandono do papel daquele que traz o conteúdo. Neste ponto, Patricia Köhler-Bailly faz a mesma constatação: “Quer dizer o quanto a aquisição de conhecimentos baseada no intercâmbio e na partilha de informações não faz parte da cultura escolar das nossas sociedades.29) Atrás da comunicação autêntica, a utilização das TIC 30), precisamente na sua função comunicativa, é uma pedra no charco do sistema. Eu retomo a hipótese de Bruno Duvauchelle: “E se as TIC se desenvolvessem numa direção radicalmente oposta ao sistema escolar?” “Como é costume na nossa sociedade francesa designar facilmente o sistema escolar como responsável pela luta contra os males da sociedade, não nos surpreendemos ao lermos estes artigos que fustigam às vezes e colocam frequentemente em evidência a resistência dos docentes. Ora, parece-me que as tecnologias desenvolvidas estão do lado oposto do modelo escolar: o sucesso escolar vive-se como individual, o docente exerce frequentemente a sua profissão dentro de uma certa solidão (pouco ou nenhum tempo de concertação no “collège” e no “lycée”), o modelo assimétrico mestre-aluno é dominante, etc. Ora, a interatividade, a comunicação interindividual e a colaboração são valores levados pelo “web social” 31) que vão ao encontro da forma escolar canônica. A função social da escola é, a maior parte do tempo, vivida mais como uma função de triagem do que de integração. Ora, além disso, a socialização e a sociabilidade desenvolvem-se, doravante, apoiando-se nos serviços oferecidos pelas tecnologias. Preocupada com o controle e a segurança, e com muita razão, tomando em conta o contexto político, a escola é progressivamente posta “fora do jogo” (a metáfora é oportuna aqui)deste movimento que propõe tomar riscos nas relações, ultrapassar os muros dos estabelecimentos e das casas, abrir-se ao mundo, às informações e aos saberes sem mediação.” 32) Em 1995, Joël de Rosnay sublinhava outra oposição entre o sistema de educação e os modos de vida de hoje, com respeto às noções de “tempo curto” e “tempo longo”: “A tele-educação por CDs e redes vai desestabilizar a escola tradicional. O conflito entre tempo curto (atualidades, clips, zapping, jogos interativos) e tempo longo (educação, formação, evolução, reflexão) vai exacerbar-se. O universo analítico, linear, sequencial e disciplinar da escola vai ser confrontado cada vez mais àquele emocional, afetivo, global, da televisão interativa e das hiper-redes. Não se trata de compensar a decalagem escolar preenchendo o espaço escolar de tecnologias educativas ou de comunicação de última moda. Trata-se de achar um equilíbrio entre tempo curto e tempo longo, favorecendo métodos e ferramentas adaptados. Uma reconfiguração da sala de aula vai se impor, da mesma maneira que ela já se impõe às empresas. Por falta de uma abordagem deste tipo, a escola corre o risco de se transformar numa “garderie” de crianças, a verdadeira educação fazendo-se em outra parte, por intermédio das redes e dos suportes eletrônicos “unimídia” 33).” 34) Seja como for, é o sistema que está fortemente autolimitador 35), sem que se possa realmente designar indivíduos que seriam os responsáveis por essas limitações. A perspectiva de desenvolvimento, e talvez de generalização das “atividades de comunicação autêntica à distância entre pessoas na aprendizagem de uma língua”, deve levar em conta a complexidade do sistema no seio do qual ela ocupa hoje a posição paradoxal que acabei de sublinhar. Podemos verossivelmente nos encontrar na mesma situação em que estávamos antes da chegada da internet com a prática da correspondência escolar, isto é, uma prática bem julgada pedagogicamente, perfeitamente teorizada, mas ainda praticada minoritariamente: jamais houve 20% de classes praticando a correspondência escolar.

4. Das competências às qualidades, das qualidades aos valores

Algumas razões a favor dessas atividades seriam viáveis: -constituem uma motivação e dão sentido às outras atividades bem aceitas pelo sistema; -valorizam a palavra do estudante, pois cada um é fonte de sentidos; -um corpus acessível é produzido por essas atividades, fresco, autêntico, vivo, e permite um trabalho presencial em sequencia, e pode mesmo ser precedido de atividades na aula de línguas que ele prolonga; -a quaidade do texto lido é muito mais importante que em qualquer outro contexto de aprendizagem; -o tempo ativo do aluno ou do estudante é 100% comunicativo durante essas atividades; -a separação das competências é efetiva 36); -a capacidade de trabalho em comum é desenvolvida; -qualidades pessoais são igualmente desenvolvidas: a autonomia, a capacidade de escolher, a responsabilidade; -asseguram a capacidade de assumir sua própria aprendizagem. Sua dimensão coletiva coloca também em jogo valores humanistas e uma dimensão ética, a começar pela reciprocidade, mas também a solidariedade, o respeito e a aquisição de um sentido da responsabilidade coletiva. Esta preocupação humanista está presente nos públicos que aprendem línguas e pode até ser uma motivação. Não há dúvida de que as línguas representam seu papel numa perspectiva de emancipação da humanidade. Dou como ilustração o seguinte extrato de discurso entre estudantes, dando à língua um papel catalizador para a paz: A O mundo vive neste momento muita crise e conflitos espantosos. Na sua opinião, isto se deve a que? Para mim, a primeira causa dos conflitos é a falta de comunicação entre lados diferentes, mesmo que eu saiba que a evolução dos meios de comunicação também contribuiu para o aumento desses conflitos. Penso, portanto, que o verdadeiro problema é nosso grau de consciência da importância de considerar que os meios de comunicação devem ser utilizados para conhecer os outros e aprender a aceitá-los e não o contrário. Isto quer dizer que eu considero, por exemplo, que a idéia do lingalog é um bom passo para melhor se conhecer e compreender nossas diferentes culturas. B La paz! Qué tema! La verdad que es un tema bastante apasionante. Muchas veces yo he pensado: Qué lindo seria si no hubiera guerras! pero también, es cierto, lo que dce Matias: con as guerras uno valora la paz. Creo que es natural del ser humano desear lo que no se tiene o valorarlo cuando ya no está. Sin embargo cuenten conmigo para empezar a luchar por la paz por medio de este sistema. Lo primero que podemos hacer es aprender a escuchar a otros, tarea no muy fácil de lograr, escucharnos a nosotros mismos, conocernos y conocerse. Me gusta mucho esta idea de sembrar paz! 37)

5. E agora, quem faz o quê?

Seja como for, não é suficiente enumerar as virtudes de uma prática ou sublinhar sua eficácia para convencer da sua validade e fazê-la adotada. No entanto, parece-me totalmente missão da instituição não deixar o público que lhe é confiado sem preparação diante do enorme objeto que constitui a internet. O fórum bilingue e o e-tandem, entre outros, são atividades que podem se praticar durante toda a vida, de modo totalmente autônomo e gratuito. Quando as pessoas formadas pela instituição tiverem o desejo ou a necessidade de aprender uma nova língua em função de um novo projeto ou de um percurso profissional, ter-lhes-á sido útil a prática dessas técnicas de aprendizagem 38) no âmbito escolar com o enquadramento rigoroso e formador além da própria parte linguística 39). Só nos resta despertar um círculo virtuoso, feito de interações positivas, que vai permitir um desenvolvimento e que a pesquisa terá de acompanhar passo a passo. Parto da idéia, aparentemente pessimista, de que se trata de um grande trabalho e que não estamos prestes a acabar. Mas é na realidade um otimismo um otimismo que me reanima, que consiste em pensar que podemos mudar as coisas se temos a prova de que elas devem ser mudadas, e que se baseia na convicção de que seremos numerosos a querê-lo. Pode-se agir nesta complexidade, uma vez que a compreendemos, mas a quem compete estender estas práticas, convencer, dar meios, controlar as evoluções, etc? Com quem se pode contar no sistema? Os didáticos 40), os pedagogos, os políticos, os públicos,…? Sobre todos, com certeza, uma vez que cada categoria tem de certa maneira, ou deveria ter, uma espécie de direito de veto sobre as mudanças que se vão aplicar a eles, mas tem também a contrapartida que é o poder de levantar certos obstáculos. Do lugar em que me encontro, a minha perspectiva passa primeiro por uma simbiose entre a pesquisa e a prática, que a instituição poderia favorecer, os políticos encorajar e os públicos devidamente informados poderiam apoiar.

6. Conclusion

Trata-se de uma utopia russoniana, como diz Claude Springer 41) ao falar do tandem, ou estamos dando um sentido novo à pedagogia, fazendo uma nova pedagogia de acompanhamento? Lá ou aqui, os práticos inventaram as práticas. Ainda não se produziu inovação propriamente falando. Falta fazer entrar, na realidade cotidiana de um meio que não pede para mudar, estas práticas que já não são novas. Falta a passagem ao ato no sistema institucional para dar à comunicação autêntica pela internet o estatuto de inovação nos nossos sistemas educativos. Ora, o momento ideal para esta transformação já chegou, parece-me, agora que os principais problemas técnicos estão resolvidos, agora que as escolas estão cada vez melhor equipadas, agora que uma nova nação que não tem território próprio mas que acolhe o mundo inteiro, internet, nos permite criar as classes planetárias com as quais nem tínhamos ousado sonhar.

Bibliografia

HELMLING, Brigitte (Ed.), L'apprentissage autonome des langues en tandem. (Collection C.R.E.D.I.F Essais) Avec la collaboration de Helmut Brammerts, Karin Kleppin, Iva Cintrat, Erik Otto, Paris: Didier, 2002.

KOHLER-BALLY, Patricia “Un forum de discussion intégré au cours de langue de spécialité ou comment faire sortir l'apprentissage de ses frontières?”, in Aline GOHARD-RADENKOVIC (éd.) Plurilinguisme, interculturalité et didactique des langues étrangères dans un contexte bilingue, Peter Lang, Berne/Suisse, vol. 11, 2005.

NARCY-COMBES, Jean-Paul Didactique des langues et TIC: vers une recherche-action responsable, Ophrys, 2005.

RAYMOND, Christine & Tardieu, Claire (eds.), Guide Tandem pour l'apprentissage des langues en binôme dans le secondaire, Rouen: CRDP de Haute-Normandie, 2001.

ROSNAY, Joël de, L'homme symbiotique, Seuil, Paris, 1995.

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